No artigo anterior começamos a abordar um tema complicado, que se estende para qualquer desporto, incluindo o ciclismo Indoor e em plataformas como o Zwift.
A verdade é que sendo o Zwift uma aplicabilidade do desporto tão singular, a sua exposição ao Doping é talvez ainda maior que em outros desportos. O Doping é uma verdadeira pandemia que invadiu o desporto e a vida de muitos atletas, incluindo imensos atletas amadores.
Falamos no artigo anterior do Doping tecnológico e do que isso acarretava consigo, por um lado do ponto de vista moral, por outro lado do ponto de vista psicológico e mental. No entanto no Zwift não está presente apenas o desportista que muda a sua altura e o seu peso, que usa uma saladeira ou que usa a bicicleta eléctrica em cima do rolo. Infelizmente também está muito presente o Zwifter que usa e abusa de substâncias para potenciar a sua performance desportiva, ignorando ou desconhecendo os riscos que acarreta para a sua saúde.
Desde já quero afirmar que eu, enquanto médico e desportista, condeno o uso destas substâncias, restringindo o seu uso, sempre e quando tenham uma indicação médica formal.
As substâncias envolvidas no doping são muitas e diversas
Quando pensamos em doping, grande parte de nós pensa logo em testosterona e esteroides anabolizantes. A verdade é que para além destes temos outras substâncias também mais “rebuscadas” e algo mais difíceis de conseguir, como eritropoetina, transfusões sanguíneas, moduladores selectivos de receptores de androgenos. Por outro lado existem substâncias muito mais acessíveis e que podem ser qualificadas como Doping, como a cafeína, alguns medicamentos como agonistas B2 (algumas bombas para a asma) ou até mesmo o ibuprofeno (Brufen) ou o Paracetamol (Ben-u-ron).
Utilizando a esquemática disponibilizada pela WADA (World Anti-Doping Agency). As substâncias usadas para efeitos de Doping podem ser agrupadas em 10 grupos. A mesma agência acaba por classificar também alguns métodos de dosagem proibidos.
Destaco aqui que para além de uma lista até bastante grande de classes de substâncias, têm o cuidado de acrescentar a S0, onde incluem substâncias que não estão incluídas no mercado ou que não são produtos de uso humano.
Destaco aqui que já têm o cuidado de incluir uma categoria relacionada com a manipulação genética, levando a crer que têm sido feitos esforços gigantescos para acompanhar este mundo em constante evolução.
A verdade é que o Doping não é todo igual, e convém termos noção que existem substâncias que são completamente proibidas, enquanto outras são proibidas acima de determinadas concentrações. Destas últimas fazem parte a Cafeína, agonistas B2 selectivos, efedrina ou a nicotina!
Na próxima tabela vemos então alguns exemplos de Doping, quais as vantagens relacionadas com o uso dos mesmos, quais os malefícios que podem estar associados.
| Substância | Classe | Para que é usado | Efeitos benéficos no desporto | Malefícios associados |
| Paracetamol | – | Analgésico e antipirético | Diminui temperatura corporal + sensação de dor e desconfortoPoderá estar associado a maior força muscular (por provar) | Insuficiência hepática aguda |
| Ibuprofeno | AINEs | Analgésico | Diminui sensação de dor e diminui inflamação. Inibição de COX poderá estar relacionado com vantagens em endurance (mecanismo desconhecido) | Hemorragia gastrointestinal, lesão renal aguda, doença renal crónica |
| Cafeína | Xantina | Estimulante | Causa ligeira broncodilatação, aumenta débito cardíaco | Náuseas, vómitos, diarreias, Hipertensão arterial |
| Efedrina | Alfa-agonista | Vasoconstritor | Aumenta libertação de adrenalina | Hipertensão arterial, dependência, hemorragia cerebral |
| Salbutamol | Beta-agonista | Broncodilatador | Broncodilatação e melhoria de capacidade VO2max | Palpitações, arritmias |
| Eritropoetina | Factores de crescimento | Produção de hemoglobina | Maior capacidade VO2max | Neoplasias e doenças hematológicas. Tromboses |
| Anadrol | Esteróides androgénicos anabolizantes | Produção de testosterona | Aumento de força, débito cardíaco e recuperação mais rápida | Confusão, problemas de sono, violência, alucinações, enfarte agudo do miocárdio |
Como disse no início isto é apenas uma abordagem superficial a um tema muito profundo e complicado. O objectivo não é, nem nunca será, encorajar o uso de Doping, muito pelo contrário, é alertar para tudo o que pode ser considerado Doping, as suas possíveis consequências menos boas e lançar um tema para que discutamos entre nós.
Como disse anteriormente, o Zwift procura que consigamos alcançar uma melhor versão de nós próprios, mais saudável. É óptimo que inclua um lado mais competitivo para puxar por nós para que consigamos alcançar essa nossa versão mais rápido ou com mais entusiasmo. Não é no entanto um motivo válido para envergar pelo Doping, ignorando as suas consequências e contrapartidas.
Se seria mais fácil chegar ao topo do Alpe du Zwift com Doping? Provavelmente. Mas o que vale a pena é lá chegar no meio do pelotão dos TugaZ, sempre realista e com noção que o que fizemos foi exclusivamente fruto do nosso trabalho e dedicação!
#Ride On
Bibliografia útil:
- https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6311632/#!po=1.06383
- https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0065266006510016
- https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2657495/
- Rev Port Endocrinol Diabetes Metab. 2014;9(2):98–105
- https://www.wada-ama.org